O último trimestre do ano concentra as maiores oportunidades do varejo: Dia das Crianças, Black Friday e Natal. Em 2025, os lojistas do Rio enfrentam um cenário mais desafiador – juros e inadimplência elevados, desaceleração do mercado de trabalho, desordem urbana e carga tributária pesada –, mas também há espaço para recuperação, se a preparação for estratégica, prática e orientada ao consumidor.
A atividade econômica mostra sinais de desaceleração no País, o que mantém a taxa de juros básica (Selic) elevada e pressiona o custo do crédito, encarecendo financiamentos e reduzindo o poder de compra do consumidor. A inadimplência também segue alta, tanto entre pessoas físicas quanto entre empresas, elevando a cautela por parte de instituições financeiras e tornando renegociações e gestão de caixa ainda mais cruciais para quem vende a prazo.
No Rio, pesquisas e análises do setor apontam retração nas vendas do varejo em 2025 e destacam impactos negativos da economia informal e do aumento da criminalidade sobre o comportamento do consumidor, fatores que afetam o fluxo nas ruas e a conversão nas lojas. A alta carga tributária pressiona margens, exigindo dos lojistas um planejamento fiscal mais rigoroso.
Diante desse cenário, o último trimestre do ano pode ser o melhor momento para as empresas lojistas recuperarem receita, se anteciparem riscos, ajustarem ofertas ao perfil do consumidor e executarem seu planejamento operacional com disciplina. Investir em planejamento de estoque, experiência de compra, canais digitais e segurança (tanto física quanto contra fraudes no ambiente digital) com certeza irá gerar bons resultados, mesmo em um momento adverso.
Como conquistar clientes cada vez mais exigentes e sensíveis ao preço
Além das dificuldades impostas pela conjuntura atual, os lojistas enfrentam o desafio de conquistar um consumidor cada vez mais exigente, digitalizado e sensível ao preço. A arquiteta e consultora especializada em varejo Claudia Lacerda destaca que o cliente entra em uma loja buscando muito mais do que promoções: ele deseja experiência, bom atendimento, conveniência e encantamento no momento da compra. É nesse cenário que o espaço físico assume um papel estratégico. “Não basta abrir as portas. A loja precisa ser vendedora”, afirma a consultora de varejo.
Segundo ela, investir em design e ambientação ultrapassa a questão estética; é preciso criar um espaço que atraia o cliente e o faça desejar entrar na loja. “Um espaço organizado, iluminado e atrativo motiva e relaxa o consumidor, aumentando seu tempo de permanência e, consequentemente, as chances de compra”, explica. Cada detalhe, da vitrine ao caixa, precisa ser pensado para direcionar o olhar e facilitar a decisão de compra, especialmente em períodos de grande intenção de consumo.
Para Claudia, alguns elementos são indispensáveis na criação de uma experiência marcante: uma vitrine atrativa que comunique posicionamento e mensagem; um layout organizado que facilite a circulação e destaque produtos estratégicos; uma iluminação que valorize os itens; estímulos sensoriais, como música e aromas; e, sobretudo, um atendimento que gere bem-estar. “Experiência é conexão. É o que faz o cliente comprar e voltar”, ressalta. Mesmo quem dispõe de pouco espaço ou tem recursos limitados pode transformar sua loja em um destino atrativo e, principalmente, lucrativo. Reorganizar a vitrine, reposicionar produtos ou melhorar a iluminação já trazem impactos imediatos. “O que muda o jogo não é o tamanho da loja, mas o olhar estratégico. É preciso ter posicionamento claro, layout funcional e oferecer uma experiência memorável”, orienta a consultora.
Claudia também chama atenção para alguns erros comuns que ainda comprometem o desempenho dos lojistas: a falta de identidade da marca, o desperdício do potencial do layout, vitrines poluídas que confundem o consumidor e uma visão restrita da loja apenas como ponto de venda. “Esses erros custam caro porque fazem o cliente entrar… e sair sem comprar”, alerta.
Em relação ao comércio on-line, a especialista acredita que a loja física tem um diferencial poderoso. “O on-line oferece preço e conveniência, mas a loja física oferece a experiência. O cliente quer tocar, sentir e viver o produto. Quando o lojista entende isso, transforma sua loja em um espaço de conexão e não apenas em um ponto de venda”, afirma. Para ela, investir em ambientação e experiência não deve ser visto como custo, mas como estratégia de fidelização. “Mais do que vender, a loja precisa encantar. O cliente que vive uma boa experiência não compra só uma vez: ele volta”, conclui.
Black Friday deve ter faturamento recorde
Estudo recente das agências Gauge e W3haus, do Grupo Stefanini, aponta que a Black Friday de 2025 deve consolidar uma mudança profunda no varejo brasileiro, ao projetar um faturamento recorde de R$ 13,6 bilhões, uma alta de 16,5% sobre 2024, com 17,2 milhões de pedidos e ticket médio de R$ 808 reais. O estudo, divulgado na plataforma Meio & Mensagem, combinou metodologias quantitativas e qualitativas, ouvindo mais de mil consumidores por meio da Stefanini Consumer Insights.
Oito em cada dez consumidores declararam satisfação com as ofertas encontradas, em 2024. Para este ano, a expectativa é ainda maior: nove em cada dez brasileiros estão propensos a comprar. Impulsionada pela maior adesão dos consumidores (44% em 2024 comparados a 29% em 2023), a Black Friday, além do crescimento em cifras, revela um consumidor em transformação: planejado, exigente, multicanal e guiado por novas prioridades.
“Estamos diante de um consumidor mais maduro, que aprendeu a pesquisar com antecedência, a usar múltiplos canais e a buscar não apenas preço, mas também benefícios agregados como cashback, cupons e conveniência”, afirma Amanda Gasperini, diretora de crescimento da Gauge.
Metade dos consumidores inicia a busca por ofertas com antecedência e metade deles já realiza a compra ao se deparar com essas promoções. Muitos aproveitam ações promocionais antecipadas, garantindo compras relevantes antes mesmo da data oficial da Black Friday que, este ano, cai na última sexta-feira de novembro, no dia 28. Esse comportamento se reflete, inclusive, nos números do varejo: a participação da data no faturamento desse período de ofertas vem caindo, passando de 52% em 2021 para 46% em 2024. Cerca de 44% dos consumidores ouvidos pela pesquisa acreditam que as promoções duram o mês inteiro, reforçando a percepção de que a Black Friday deixou de ser um evento pontual e passou a se estender ao longo de todo o mês de novembro.
“A antecipação mostra um consumidor atento a oportunidades reais. Para as empresas, isso reduz a concorrência concentrada na data e dá aos consumidores mais tempo para pesquisar e comprar, contribuindo para o aumento do ticket médio no período”, afirma a executiva. Vale lembrar que a diluição das vendas exige consistência das marcas para manter o interesse do público por semanas.
Novas prioridades de compra
A Black Friday, que antes era sinônimo de compra de eletrônicos, hoje se consolida como momento de compras voltadas ao uso cotidiano. O levantamento das agências Gauge e W3haus mostra queda de 5% na intenção de compra de eletrônicos e de 2% em eletrodomésticos, ao mesmo tempo em que categorias como roupas (+7%), perfumaria (+5%) e produtos de beleza (+7%) ganham relevância, indicando a ampliação da data para itens de menor ticket e uso mais frequente. O consumidor, segundo a análise, está equilibrando desejo pessoal com necessidade prática, com foco em conforto, saúde e bem-estar.
Embora o preço continue sendo um ponto central, seu peso caiu 10% desde 2021. Em seu lugar, ganham importância fatores como custo-benefício, facilidades de pagamento (43%), cashback (40%) e cupons (48%). O planejamento também se
tornou peça-chave: metade dos consumidores começa a buscar ofertas com até 60 dias de antecedência, e cresce o uso de inteligência artificial para apoiar decisões, já presente em 29% das compras.
O cenário aponta para um consumidor mais informado, exigente e estratégico, que espera conveniência e fluidez em cada etapa da jornada.
Experiência multicanal alavanca vendas e fideliza clientes
A jornada de compra varia de acordo com a faixa etária. Jovens de 15 a 28 anos pesquisam on-line e recorrem ao ponto de venda físico para validar suas escolhas, enquanto consumidores mais velhos tendem a realizar todo ou a maior parte do processo nas lojas.
Canais digitais como TikTok Shop e Instagram (agora indexado por buscadores), live commerce e influenciadores funcionam como vitrines e pontos de conversão. O aplicativo da marca, muitas vezes baixado para aproveitar promoções, permanece instalado em 90% dos casos, uma oportunidade para prolongar o relacionamento e estimular recompras.
Enquanto o ponto físico mantém relevância para experimentação e validação, o digital é decisivo para fechar a compra. A integração desses formatos reduz arrependimento e aumenta a propensão a experimentar marcas novas. Ainda segundo o estudo, o impacto é expressivo: 37% dos consumidores já realizaram compras durante uma live de Black Friday. No fim das contas, não se trata mais de escolher entre físico ou digital, mas de integrar os dois mundos para entregar conveniência, confiança e encantamento ao consumidor.
A força do comércio físico
Na pandemia, o comércio eletrônico ganhou muita força, consolidando-se e mostrando às empresas lojistas a importância de estarem presentes também no mundo digital. Hoje, no entanto, o comércio físico voltou a ser relevante, especialmente na descoberta de produtos e na experiência personalizada, a ponto de marcas que nasceram no ambiente digital abrirem lojas, revelando um movimento de reequilíbrio. O estudo das agências Gauge e W3haus, que ouviu mil pessoas em todo o país, apontou um crescimento de 7% da loja física e da TV como canais de busca por ofertas.
No Centro do Rio, o Polo Saara, uma das regiões comerciais mais tradicionais do país, é a prova da força do comércio físico. Lembrando que o polo acaba de lançar um aplicativo para conectar lojistas e clientes – o Partiu Saara (leia na pág.10) – o presidente da entidade, André Haddad, afirma que o diferencial está justamente no que nenhuma plataforma digital consegue replicar:
“Temos algo que nenhum marketplace ou e-commerce é capaz de oferecer: a experiência de compra. É o prazer de caminhar pelas ruas do Saara, parando para tomar um café ou fazer um lanche, aproveitando a variedade de opções, observando as pessoas e interagindo com as diferentes culturas que dão vida ao Polo. O marketplace é um reforço importante, um canal a mais para os nossos lojistas divulgarem seus produtos, mas o público busca mais do que isso. Ele quer passear pelas ruas, conviver, estar presente — em resumo, sentir a rua.” Haddad disse que os lojistas do Saara estão otimistas para as vendas de fim de ano. “O espírito positivo, típico do comerciante, é um motor de prosperidade. Estamos confiantes para este fim de ano e investindo muita energia também nas redes sociais, para levar ainda mais consumidores às ruas do Saara”, destacou.
O último trimestre de 2025 traz muitos desafios, mas também muitas oportunidades latentes. Com planejamento, foco no cliente e execução disciplinada, o período pode ser o ponto de virada para este ano.